O devorador de um sonho
As
semanas cheias e movimentadas de acontecimentos davam fortes indícios de que o
tempo estava passando. A sensação do acelerado, efêmero e das transformações
estava presente nesses indícios. Para Ela, o tempo passara, mas a sua percepção
era a de que há poucos dias estourara fogos para celebrar o ano novo. Contudo,
na realidade, um novo ano novo já estava por vir. A sua existência estava sendo
devorada por um tempo selvagem e manso o suficiente para Ela não se dar conta
deste movimento. O fluxo dos fatos inesperados a impulsionava para frente, sem
dar-lhe condições de sentir que alguns meses se passaram.
Há
um tempo Ela dizia que gostaria que o tempo passasse depressa e que tudo
mudasse. O seu desejo era o de que o tempo devorasse o seu sonho não realizado.
Sentia-se angustiada e gostaria que tudo em sua vida fosse de outro jeito. O
tempo tem feito à parte dele. Ele tem passado cada vez mais rápido e engolido o
seu cotidiano antigo e emergente, mas Ela não conseguiu fazer a sua parte e
tudo ainda não mudou.
–
“Seria tão mais fácil se o tempo levasse o que me prende e faz acreditar que as
coisas não mudam. Seria tão mais fácil se o tempo também devorasse esse desejo
intenso por este sonho” – vislumbra.
A
promessa de que o tempo era veloz e a de que ele tudo devorava, na verdade, é uma
grande ilusão? Ou será que o quê o tempo não devora é algo superior a qualquer
compreensão sagaz e que perpassa por vidas e nunca vai embora? Será o desejo o
sentimento mais imortal de todos?
Pobre
Ela. Só queria que o tempo também devorasse esse desejo, essa vontade
pulsante por esse sonho. Tudo realmente pode ter mudado, no entanto, o desejo
ainda se mantinha intacto, mesmo diante de tantas transformações em sua vida. O
seu sonho seria impossível de ser devorado ou o desejo mantinha esse sonho,
porque ele é o mais forte nessa situação? Seria esse o eterno e infinito? Àquilo
que o tempo não devora: o desejo por um sonho? ∞