Contadora de histórias







             Próximo ao espelho largo, Ana estica a malha do macacão e se prepara para mais um dia de treino pesado na academia. Observa as maçãs do rosto, o contorno do corpo e o brilho dos cabelos castanhos claro. Parece feliz com os resultados. A imagem é pura admiração.
            A malha valoriza as suas curvas a ponto de desviar atenção aos hábitos do final do dia. Vai à academia para sentir-se bem, porque os elogios recebidos pelo corpo a faz esquecer-se da realidade a qual se esquiva.
No entanto, Ana continuava a contar histórias em que manipulava o final. Todas as noites repetia o mesmo conto, com esperanças de um final feliz. Fechava os olhos e abraçava-se diante do delírio da realização.
             Com tais movimentos a vida lhe parecera um pouco desinteressante e ao mesmo tempo sentia seu espírito cada vez mais angustiado. De onde vinha tamanha angústia? Via-se em pêndulos e não sabia como romper com o que parecia eterno.
            Nas encaradas no espelho, se deu conta da saudade. Não se tratava da saudade comum, presente nos mortais, por lembrar-se das pessoas consideradas essenciais. Mas de um hábito perdido diante de todas as voltas dadas durante a vida.
Sentia saudades do sonhar e de ter esperanças de que pode ultrapassar o superficial. O mundo material e as idas à academia já não a interessava mais. O que Ana talvez quisesse tem nome, materialidade, e é mais do que a imagem refletida no espelho. 



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