Onde por pontos?
– Pró Lu, não quero ter de fazer isso outra vez!
–
O quê, Pedrinho?
–
Escrever!
–
Não quer mais, por quê?
–
Porque é difícil e eu saio cheio de perguntas. Nem eu sei como as fiz.
Lu
retira os óculos do rosto, fecha a página do diário e fita o garoto por alguns
segundos.
–
Estou aqui para te ajudar no que sente dificuldade. Que tipo de pergunta você
faz?
–
Na verdade é aquele negócio dos pontos. Nunca sei quando usar vírgula, ponto de
continuação, ponto parágrafo, ponto final e nem sei mais o quê. Não sei arrumar
as palavras nas frases e me perco no sentido de algumas. O dicionário é grandão.
Quando leio a minha redação saio cheio de dúvidas. E também eu... Ei pró Lu, está
sorrindo por quê?
–
Você só está na quarta série, não se preocupe. A sua dúvida irá te acompanhar a
vida inteira.
Pedrinho
observa Lu, enquanto morde o lápis seguidas vezes. Lu continuou:
–
Os pontos no texto são como a vida experimentada. A vírgula é a pausa leve,
para separar o diferente, exemplificar, respirar e outras coisas que verá com o
tempo. O ponto de continuação é a pausa mais densa, mas que segue num mesmo
assunto até a finalização. O ponto parágrafo é quando uma parte importante
termina e segue para outra, nem sempre no mesmo ritmo. O ponto final é o
fechamento de um grande ciclo, com ideias, experimentos e sensações usadas para
construir outros textos.
–
O que é experimento?
–
São as suas ações. Na realidade, os momentos em que aprende com elas. Cada ação
traz outra e consequências. É como fazer uma prova, ao acertar e errar questões.
O que conseguir aprender, fazer e lembrar pode ser considerado experiência.
–
Acho mais fácil brincar. Parece difícil, não quero mais! – Joga o lápis na
mochila e mantém os olhos na pró.
Lu
mantém o riso no rosto e continua:
–
Você aprenderá, mais adiante, a pontuar a própria vida. Todo texto precisa de
pontuação. Se ela estiver correta, mesmo tendo coisas ruins e difíceis
escritas, a leitura será fluída e harmônica. Se estiver incorreta tudo
estacionará e perderá o sentido. É bom que aprenda e respeite os sinais de
pontuação, será útil para toda a sua vida, embora ler e escrever sempre
provoque dúvidas.
–
Se é tão importante, então por que pouca gente ensina certo? Já estou na quarta
série e não aprendi esse troço chato!
–
Porque o processo depende mais da gente do que dos outros, Pedrinho. Essa
conversa pode entrar na sua cabecinha agora, mas só entenderá quando fizer
esforço ou tiver condições.
–
Olha aí, num disse! Agora estou cheio de dúvidas outra vez. Não quero mais, pró
Lu! Quero brincar, não quero escrever nunca mais! Não vou! Nunca, nunca!
–
Você pode brincar, mas sentirá necessidade em aprender a pontuar com o tempo.
Agora dê uma volta no pátio, brinque com os seus amigos. Vá para casa depois. Um
dia irá se lembrar dessa nossa conversa.
Hoje Pedrinho é Pedro, tem pouco mais de 60 anos e a
memória já não é a sua melhor amiga. Ele se esquece de tudo, exceto da conversa
tida com a pró Lu. Mesmo com a idade, ainda tem dúvidas de como pontuar. No
entanto, aprendeu a gostar de escrever a própria vida e a brincar com o que ela
traz. ∞