As trocas
Véspera
de feriado e loja de varejo, combinação nada agradável. Mães que levam as
crianças pequenas, pais que não veem a hora de retornar para casa, caixas
inoperantes e um corredor de guloseimas para você gastar, digo, aguardar. É
típico, só falta o calor.
No meio
disso tudo, estou com um produto quebrado debaixo dos braços aguardando uma
troca. Quando finalmente descubro quem irá me atender, deparo com um rosto
triste, preocupado e confuso. Os olhos brilhavam como se fossem chorar a
qualquer momento. Ela não parecia feliz. Que tipo de coisa não teria
passado ou tem de passar para se manter ali? Enquanto isso, dizia as demais
companheiras de trabalho sobre o que iria fazer no final do expediente - tarde
da noite, provavelmente. Senti que àquilo era uma tentativa de encontrar
algum sentido para àquilo que não a fazia bem. A gente sempre tenta
justificar o que estamos fazendo com algo positivo, mesmo sabendo da
fragilidade desta justificativa.
Não gosto
de não saber com quem estou falando, então lhe perguntei o seu nome e me
apresentei. Sentei numa poltrona pouco confortável, que provavelmente várias
pessoas cansadas já teriam sentado e esperei os procedimentos iniciais. Já
estava cansado de tanto esperar, mas essa garota que me atendeu parecia muito
mais saturada. O que eu poderia fazer para ajudá-la? O que poderia minimizar os
estragos dando um sentido a essa espera longa?
Retirei a
chave do bolso, junto com a nota fiscal e como se encontrasse a resposta,
sorri. Sorri para ela enquanto estava me atendendo, logo no começo. Talvez de
longe possa parecer pouco o que fiz, e nem ela entendeu o porquê do meu sorriso
no meio daquele caos, mas, permaneci com ele até o final. Incrível como as
pessoas estranham quando outras são gentis e simpáticas com elas. Isso indica o
quão desacreditados estamos na espontaneidade do outro.
Como
atendimento de troca costuma demorar mais do que o de compra -- quando um
vendedor avistar você, no dia seguinte com uma caixa na mão ele não estará
nenhum pouco feliz! -- pude ir conversando com ela e aos poucos foi sorrindo
comigo. De início um riso tímido, como se estivesse ali apenas para compor
cena. Educação. Com os devaneios das conversas informais, pôde sorrir
mais gentilmente.
No final
de mais de duas horas aguardando a troca, recebi o meu produto novo de uma moça
com um sorriso doce e gentil. Pode parecer loucura ou fantasia, mas deixei com
ela um pouco mais de confiança e conforto quando comecei a sorrir.
Hoje, depois
de mais de dois anos, o meu produto já começou a dar defeito. No entanto, ainda
me lembro daquele sorriso gentil ao entregar o produto no final da troca.
Lembrança que certamente deverá ter mais validade do que o produto. Quem sabe
eu tenha feito o diferencial naquele dia tão caótico e cansativo, diante de um rosto
tão exausto passando por tantas privações num emprego? Gosto de pensar nessa
possibilidade.
Lembro-me
de outra cena claramente: voltando para casa fiquei imaginando como seria a
vida se as pessoas sorrissem mais. Neste caso, o sorrir mais significaria aceitar
a espontaneidade e envolvimento inerente às relações humanas.
é impressionante como um sorriso pode mudar o dia de uma pessoa
ResponderExcluirExcelente post!
Mariel,
ResponderExcluirExato, fico imaginando como nossa vida seria com mais espontaneidade e sorrisos.
Obrigado pelo comentário!