Entre muros e escombros
Era maçante. Todos os dias ele
acordara cedo e partia para construção de sua casa. Erguia durante o dia os
mesmos muros, sob sol escaldante ou sob tempestades. A cada tijolo encaixado, sentia
a responsabilidade e envolvimento.
Era maçante. Todas as noites
alguém, conhecido ou diferente, aparecia e destruía todos os muros. Estaca zero,
mais uma vez. Era desgastante demais, nem ele sabia como arrumava forças para
levantar todas as manhãs e reconstruir tudo que ele tanto se entregou
construindo.
Era triste, melancólico e algoz,
perceber que tudo que fora erguido e cristalizado se desmanchava em questão de
segundos, e pior: por outra pessoa. Sentia-se frustrado, pois a volatilidade
era em excesso. A efemeridade da situação o incomodava deixando-o descrente de
tudo. Seu semblante fitava tudo de maneira distinta, embora confuso, sabia
parte do que sentia e o que realmente queria.
Uma construção sempre a espera da
demolição, como algo perecível. Isso era angustiante. As pessoas têm o dom de
construir extensos universos, algumas vezes involuntariamente. Sentia
diariamente o peso de cada tijolo demolido e erguido.
Em questão de segundos, anos,
meses, sentimentos e significados parecem deixar de existir. Tornando-se
ocultos, ou, por azar, se convertem em escombros. Tudo
pode continuar existindo, mas agora com um contexto e significado diferente.
A diferença em questão nem sempre
é algo bom para quem está construindo muros. É maçante e tedioso ter de
construir e reconstruir algo em intervalos curtos. A volatilidade nem sempre se
faz presente quando se muda tudo o tempo inteiro. Suspiros, sentimentos,
desejos e sonhos não desaparecem de uma hora para outra sem algum motivo. Se
eles estão se atenuando é porque algo já passou ou se quebrou. Mas nada é tão
definitivo e previsível. Mas algo é mais do que certo: as pessoas constroem e
destroem o tempo inteiro. Não só dentro de si, mas também fora, com os outros
através de ações ou palavras.
A linha entre o agente destruidor
e vítima são tênues e a mudança de lados é muito mais volátil e inesperada do
que aparenta ser. A construção de muros é mais do que necessária. A destruição?
Também. Desde que ela não seja tão algoz e presente, pois é mais do que difícil
acreditar em algo, quando se têm alguém todas as noites destruindo o que
parecia concreto e real.
É maçante e ao mesmo tempo
construtivo se perder entre muros e escombros. O problema é que nem sempre
conseguimos nos manter neste ritmo da obra. Nem sempre há fôlego e força para
construir o que se destrói facilmente.
Comentários
Postar um comentário
Bem-vind@ a Ótica Cotidiana!
Obrigado pela visita e leitura do texto.
Participe deixando a sua opinião, comentário ou questionamento sobre o texto.
NOTAS :
- Não serão tolerados qualquer mensagem contendo conteúdo ofensivo ou de spam.
- Os comentários são de plena responsabilidade dos seus autores, ainda que moderados pela administração do site.
- Os comentários não representam a opinião do autor ou do site.